A prisão do deputado federal Daniel Silveira por propagar discurso de ódio contra
ministros do STF, ideias contrárias à ordem constitucional, ameaça e apologia ao AI-5
(Ato Institucional 5), tem sido motivo de debates quanto à sua legalidade e os limites da
liberdade de expressão.
Na noite de terça-feira, (16), para justificar a prisão do parlamentar, o ministro
Alexandre de Moraes alegou a “infração permanente”, que consiste em uma ofensa
constante, cessando apenas com a vontade do agente.
Entretanto, se levanta também quais são os limites da liberdade de expressão (artigo 5º
da Constituição) em detrimento de ameaças a outrem. Todo indivíduo tem direito
constitucional à liberdade de opinião, entretanto, é preciso não confundir com
difamação, que é quando se fala mal de outra pessoa sem fundamento algum. Dessa
forma, é importante que os indivíduos entendam seus limites ao emitir opiniões e
arquem com as consequências de seus excessos, inclusive o cometimento de crime.
Um dos pontos mais polêmicos da decisão liminar diz respeito à prisão em flagrante.
Para o ministro, “ao parlamentar postar e permitir a divulgação do referido vídeo,
encontra-se em infração permanente e consequentemente em flagrante delito, o que
permite a consumação de sua prisão em flagrante”.
De acordo com o criminalista Antonio Baptista Gonçalves*, presidente da Comissão de
Criminologia e Vitimologia da OAB/SP – subseção de Butantã, a interpretação do
flagrante por parte do ministro Moraes foi uma construção baseada em uma analogia,
que não se confirma na prática. “Quando o deputado faz a ameaça, coloca em risco a
integridade física de outra pessoa, no caso ministros da justiça, entretanto, isso não
caracteriza um flagrante, pois o crime não estava em andamento, como assim prevê
nosso ordenamento jurídico”.
Entretanto, o especialista acrescenta que poderia ser passível de análise a decretação da
prisão preventiva, como o próprio ministro Moraes fez quando foi ameaçado em video
por Sara Giromini. “Nada no Brasil autoriza o Supremo a ser acusador e julgador ao
mesmo tempo e suprimir a independência das instituições, ele não tem autonomia
jurídica para isso e deve respeitar os ritos processuais e constitucionais que ele mesmo
é o responsável por garantir. Ao não fazer isso, ele fere o direito à ampla defesa e ao
contraditório”.
Para Gonçalves a atitude do parlamentar merece cuidados com o objetivo de preservar o
estado democrático de direito, mas é preciso respeitar os limites de cada poder. É
necessária a denúncia do caso na Comissão de Ética da Câmara dos Deputados para
investigação e averiguação da conduta do parlamentar. Caso ela entenda que a postura
seja grave e passível de condenação, deve remeter ao órgão competente, no caso ao
Ministério Público Federal, que deverá encaminhar ao STF para que julgue e aplique as
sanções cabíveis. “O correto seria o encaminhamento de reclamação para a comissão de
ética da Câmara dos Deputados. Não me parece razoável privar a liberdade de alguém
por uma ameaça. Logicamente que o conteúdo do vídeo é grave e assustador, o
deputado deve ser responsabilizado por tudo o que disse, mas a pena por ele ter
extrapolado a liberdade de expressão não pode ser confundida com a perda de
liberdade”, finaliza Gonçalves.
* Antonio Baptista Gonçalves é advogado, Pós-Doutor, Doutor e Mestre pela PUC/SP e
Presidente da Comissão de Criminologia e Vitimologia da OAB/SP – subseção de
Butantã.
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